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Filosofia do Design – O Designer bem-sucedido

quinta-feira, dezembro 08, 2011 | Author: #Design |


Embora me faltem dados estatísticos concretos, tenho a intuição de que o número de psicólogos que se formam por ano é maior do que o número de engenheiros. Com a mesma intuição, porém, creio que a demanda brasileira por engenheiros é maior do que por psicólogos. Logo, a maioria dos psicólogos trabalha com RH, secretaria ou até almoxarifado. Parece familiar? Não responda ainda. Lembre-se apenas de quando você estava aprendendo a tabuada na escola e me diga se o seu estereótipo de bem-sucedido era, por acaso, o contador ou o contabilista.

Não, bem-sucedido pra uma criança (e pra qualquer um) é o pugilista que ganha 5 milhões numa noite, a modelo que recebe 15 milhões por desfile, o cantor que arrebata 500 milhões num disco. Situando-nos, agora sim, no Design, vemos a falta de interesse dos alunos pela produção acadêmica (muitos se formam sem ter um único artigo publicado) e a consequente dificuldade de argumentar sobre seus projetos. Talvez o ideal do designer bem-sucedido dos professores, necessariamente pós-graduados, não seja o mesmo ideal dos alunos. A questão “como posso aplicar isso no mercado?” revela a grande distância entre o que é ensinado e o que o mercado exige. Por outro lado, entre os alunos, muitos desconhecem o verdadeiro papel da academia diante do mercado de trabalho, embora tenham optado (ou foram forçados?) a ingressar em uma faculdade.

Porém, os próprios professores hesitam sobre o verdadeiro papel da academia ao depararem-se com o dilema: o Ensino do Design deve guiar ou ser guiado pelo mercado? Sem saberem responder, ensinam determinados métodos como leis ou regras antes mesmo que o aluno tenha uma experiência projetual em si, isto é, uma necessidade real de se projetar. Pior que isso, censuram os poucos alunos que tentam pesquisar os diversos métodos existentes além daqueles que são ensinados. Para o educador anarquista Celéstin Freinet (1988, p. 15), “O problema essencial da nossa educação não é de modo algum – como pretendem hoje nos fazer crer – o conteúdo do ensino, mas a preocupação essencial que devemos ter de fazer a criança sentir sede”.

Retomando o ensino de Design, noto que as disciplinas teóricas, mesmo quando procuram demonstrar a aplicação da teoria, não provocam a sede ou o apetite no aluno, mas sim enfiam o conteúdo “goela abaixo”. Certamente há um abismo entre a teoria e a práxis do Design, abismo esse que se intensifica quando qualquer questionamento primário (O que é design? Arte ou técnica? Criatividade ou método? Estética ou função?) é desencorajado pelos professores que, por sua vez, consideram tais questões demasiado polêmicas e improdutivas. Consequência disso é uma eterna repetição que se perde na causa e no sentido, fazendo com que o aluno engula a teoria e tenha sempre uma indigestão posterior.

“É provável que nos digam que não temos de formar sonhadores, mas homens práticos” (FREINET, 1988, p. 21). Seguindo o mecanismo mercadológico de requisitos e prazos, os alunos são avaliados por meio de um check-list de metas a serem cumpridas. Você é forçado a manter o foco, desprezando sua curiosidade em saber como poderia ser de outro jeito que não o jeito certo. Se o mercado não permite que o designer seja curioso, em que momento além da academia que haverá a oportunidade para isso? Não raro, o aluno cola na prova teórica, faz um trabalho de última-hora ou inventa uma mentira para tentar recuperar a nota.

Então o professor descobre tudo e dá uma lição de moral no aluno. Ora, todos querem ser bem-sucedidos e, no entanto, o fracasso inibe, destrói o ânimo e o entusiasmo. Reiteramos que o aluno é avaliado por ter cumprido uma tarefa, num determinado prazo e dentro de um conjunto de requisitos. Não é avaliado pela criação em si, fundamentação, articulação de ideias ou mesmo pela construção de seu próprio caráter. Essa tomada de consciência, sem dúvida, se apresenta como um grande desafio em um meio que pretende ser eficaz e objetivo. Frente a isso, o que eu proponho neste texto é apenas algumas das diretrizes de Freinet aqui adaptadas (sem muito esforço) ao ensino de Design.

Em primeiro lugar, ninguém gosta de trabalhar sem objetivo, atuar como máquina, sujeitando-se a rotinas nas quais não participa. Seguindo o raciocínio de Freinet (1988), é fundamental a escolha do aluno e a sua própria motivação com relação não apenas ao seu próprio projeto, mas aos seus próprios objetivos e métodos. Aliás, os métodos devem ser vistos como ferramentas, não como regras a serem seguidas cegamente. Restrições, requisitos e metas fazem parte do mercado e o aluno deve saber disso. Porém, o professor deve auxiliar o aluno a usufruir de suas potencialidades, deixando claro que o mercado é apenas uma dentre tantas outras possibilidades. Do mesmo modo, a distância entre teoria e prática deve ser evidenciada e não escondida. A ambiguidade, a incerteza e os percursos entre o objetivo e o subjetivo são prerrogativas que, embora não sejam bons critérios de avaliação, ajudam a diminuir essa distância quando não são reprimidas. A avaliação do aluno, por sua vez, deve ser feita simplesmente conforme o seu envolvimento, participação, qualidade de presença em sala de aula e potencial reflexivo-argumentativo.

Isso tudo é óbvio. Tão óbvio quanto o papel do professor em tornar o aluno sujeito do seu próprio conhecimento, sendo a aplicação desse conhecimento dependente do sentido e do valor que o aluno contempla em seu ato de conhecer. Mais do que óbvio, porém, cabe a nós fazer disso algo que nos pareça finalmente familiar.

“Somos uma geração de copistas-copiadores, de repetidores condenados a registrar o que dizem ou fazem homens que nos afirmam ser superiores e que, muitas vezes, só têm sobre nós o privilégio da antigüidade nessa arte de copiadores e de repetidores. Somos uma geração para a qual a obra criadora, esse primeiro escalão da obra de arte, foi reduzida à clandestinidade. Estude! Copie! Repita!… Você nunca tirará nada de esplêndido das suas mãos desajeitadas e do seu cérebro.

Fonte. designsimplesLink


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